Expedição a Serra da Mantiqueira inspira chefs que vão participar do Circuito Gastronômico da Pampulha 2019 25/05

Durante três dias, chefs e imprensa visitaram cidades na Serra da Mantiqueira, no Sul de Minas

Minas são muitas, já dizia Guimarães Rosa. E isso faz mais sentido ainda quando exploramos suas riquezas culturais e gastronômicas. Chefs, representantes de entidades imprensa e o comitê organizador do Circuito Gastronômico da Pampulha (CGP) visitaram diversas cidades em torno da Serra da Mantiqueira. A ideia central foi garimpar ingredientes para inspirar os chefs a desenvolverem seus pratos para a edição de 2019 do CGP – evento que reúne restaurante de um dos bairros ícones de Belo Horizonte entre os meses de setembro e outubro. A expedição teve o apoio da Belotur, Sebrae-MG e da Emater, parcerias fundamentais para a realização do evento.

©2019 Nereu Jr

Mas não foi apenas isso. A vivência de experiências incríveis, o fomento ao relacionamento entre os que participam da expedição e conhecer locais incríveis e seus sabores e sua gente tornaram essa excursão algo mais do que especial. Após a visita ao local, os restaurantes farão estudos dos ingredientes com a formação e a conscientização sobre a relevância da cultura alimentar e criarão pratos inéditos nos restaurantes participantes, elaborados com muita criatividade utilizando os ingredientes locais.

Expedição Serra da Mantiqueira – Circuito Gastronômido da Pampulha ©2019 Foto: @nereuJr

Este foi o segundo ano da expedição gastronômica. Ano passado, os viajantes estiveram no Norte de Minas, no que chamaram de Expedição ao Grande Sertão Veredas. Em 2019, a escolha foram as montanhas da Serra da Mantiqueira. Entre os sabores e produtos encontrados, o chef Edson Puiati elenca mais de 28 tipos diferentes de iguarias. Algumas, como o azeite e alguns queijos, trutas e frutas, só são possíveis ali, pela geologia e clima específicos dessa parte da Serra da Mantiqueira. Também se destacam as águas de São Lourenço e Caxambu, com propriedades medicinais e terapêuticas.

Entre tantos, Puiati destaca os queijos finos e artesanais, azeite, frutos orgânicos como as berrys, truta, cafés, vinhos, águas, pinhão, doces e geleias, palmito, cogumelos e ovos orgânicos, alcaparras, lúpulo, urucum, lavanda, cascara do café, cachaça, mel, mostarda, hibisco, licores, aguardente de banana e tangerina, ovas de truta, farinha de milho branco de biju e fubá branco e até azeite em pó. Há ainda algumas geleias com sabores exóticos como café espresso e uvaia.

Expedição Serra da Mantiqueira – Circuito Gastronômido da Pampulha ©2019 Foto: @nereuJr

A Serra da Mantiqueira é uma cadeia montanhosa que se estende por três estados do Brasil: São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro e a região tem altitude média de 1200 a 2800 metros. Por essas características de clima e relevo, teve seu processo de ocupação associado à expansão da cafeicultura e muitas cidades surgiram das lavouras de café. Atualmente, atividades ligadas à agropecuária são a base econômica dos municípios que fazem parte da região. No setor pecuário, o destaque vai para a suinocultura e na indústria agrícola para a destilação de álcool.

Expedição Serra da Mantiqueira – Circuito Gastronômido da Pampulha ©2019 Foto: @nereuJr

A viagem

A expedição começou em Caxambu, onde os participantes conheceram a maior atração turística da cidade: o Parque das Águas, com cerca de 210 mil metros quadrados de área. O local conta com 12 fontes de águas minerais, gasosas e medicinais, com propriedades diferentes umas das outras. Depois seguiram para Cruzília, onde visitaram o Queijo montanhês Capa Preta, no Laticínio Ozório Barros. Além desse destaque, ele produz outros clássicos como provolone e queijo do reino.

Expedição Serra da Mantiqueira – Circuito Gastronômido da Pampulha ©2019 Foto: @nereuJr

Seguiram então para Aiuruoca, e no caminho, também conheceram o produtor Queijo Du’Tutti de quejios artesanais,  que produz queijo tipo parmesão. Já em Aiuruoca, foram ao produtor de azeite Olibi. Além de azeitonas em conserva, do azeite em óleo tradicional, ele produz a versão em pó, que pode ser usada em receitas e até em drinks. Já no Sítio Cambará, as geleias totalmente artesanais e o processo de fabricação manual são os destaques. Eles fazem até  300 potes por mês e os sabores disponíveis são amora, mirtillo, framboesa e physalis. Esses são exemplos de produtos que podem ser desenvolvidos na região, pois o clima coopera bastante. No caso das azeitonas, o solo pobre daquela região também contribui.O almoço foi especial. Bem no meio do Vale do Mututu, a Tia Iraci tem aquele restaurante bem típico de Minas Gerais,com fogão a lenha, muito sabor e ingredientes colhidos ali na horta. O frango caipira estava perfeito. Além de produzir sua própria cerveja artesanal com destaque para um estilo feito com amendoim.

Expedição Serra da Mantiqueira – Circuito Gastronômido da Pampulha ©2019 Foto: @nereuJr

Depois o grupo seguiu para Alagoa onde fechou a noite com uma visita a loja Queijo D’Alagoa, do simpático Oswaldinho, que apresentou os diversos queijos locais, premiados internacionalmente, incluindo o Queijo Alagoa Grande, medalha de bronze no Mondial du Fromage, em Tours na França. Depois de um primeiro dia puxado, a expedição seguiu para São Lourenço, onde jantaram e pernoitaram no Hotel Fazenda Vila Chico.

Expedição Serra da Mantiqueira – Circuito Gastronômido da Pampulha ©2019 Foto: @nereuJr

O segundo dia começou com um passeio no sensacional pelo parque das Águas de São Lourenço. São 430 mil metros quadrados de área, com sete fontes de águas minerais, cada uma com suas propriedades terapêuticas e medicinais em particular. Atravessaram a praça e foram conhecer a loja dos Doces São Lourenço, bastante famosos. Doces de leite, geleias, e outros típicos como ambrosia e chuvisco são as estrelas do estabelecimento.

Expedição Serra da Mantiqueira – Circuito Gastronômido da Pampulha ©2019 Foto: @nereuJr

Depois, eles deram uma passada no laticínio Miramar, onde nasceu o tradicional Catupiry. Após a separação da sociedade, São Lourenço ficou com o Cremelino e a honra de ter sido a cidade onde o requeijão foi criado. Seguiram então para o Unique Café, empresa com premiações relevantes, onde os integrantes da expedição puderam vivenciar o processo de torrefação e receberam algumas informações sobre os grãos de café e conhecimentos gerais sobre a bebida.

Expedição Serra da Mantiqueira – Circuito Gastronômido da Pampulha ©2019 Foto: @nereuJr

A expedição passou no hotel fazenda Bavária, em Pouso Alto, para o almoço e seguiu para a Queijaria da Montanha, em Delfim Moreira, já na divisa com São Paulo, onde puderam degustar mais opções locais. O jantar foi na Cervejaria Artesanal Kraemerass, restaurante estilo alemão. Destaque para as cervejas produzidas ali mesmo. A pernoite foi em Itajubá. E logo cedinho no dia seguinte, última etapa da expedição, mais cerveja.

Expedição Serra da Mantiqueira – Circuito Gastronômido da Pampulha ©2019 Foto: @nereuJr

Cerveja, cachaça, gin e aguardentes. Uma visita à cervejaria e destilaria Musa, que produz cerveja, cachaça, licores, gin e aguardente de banana e tangerina. Mas quem roubou a cena foi a plantação de lúpulo, ali no quintal da fábrica. Muitos nunca tinham visto de perto o lúpulo, um dos principais ingredientes para fabricação da cerveja, que precisa de frio para se desenvolver e o clima da Serra da Mantiqueira é bem propício para isso.

©2019 Nereu Jr

Um dos melhores momentos da excursão foi o trutário. Voltando a Delfim Moreira, eles conheceram uma criação e puderam vivenciar a reprodução dos peixes, realizada por um funcionário do local. As ovas foram extraídas da fêmea e o sêmen dos machos, tudo sob os olhares curiosos dos jornalistas e chefs.

©2019 Nereu Jr

Já nos finalmentes, almoçaram em Santa Rita do Sapucaí. A sobremesa foi uma visita ao Pedro Dias do Grandpa Joel’s Coffee, responsável por projetar Santa Rita em todo o país e no exterior. Degustação de cafés, chás com a casca do fruto e até mesmo um presente: livro de receitas Delícias do Café, escrito por Marina de Castro Barbosa,com receitas propostas com um ingrediente em comum: o ouro mineiro.

©2019 Nereu Jr

Impressões

De domingo a quarta-feira, foram visitas surpreendentes, sabores incríveis, relacionamentos e inspirações. O curador desta viagem foi o Chef Edson Puiati, que fez um balanço da aventura:

“Para mim, a expedição teve três pilares: conhecimento, relacionamento e experiência. Cada lugar é uma experiência. Seja no experimentar os produtos ou ouvir o pensamento dos produtores e das pessoas que representam os lugares que nós conhecemos para também entendermos um pouco do contexto do território. É importante que os participantes da expedição percebam que todos os locais que visitamos nos dão exemplos que podem inspirar todos os restaurantes que estiveram lá. A idéia de corporativismo, associativismo e de trabalhar em conjunto deve ser avaliada. Foram cases de sucesso que presenciamos nos campos gastronômico,econômico e de desenvolvimento social. Tivemos exemplos negativos. Mas a maioria dos exemplos foi positivo”, avalia.

Na visão de Puiati, os hábitos e as influencias européias ajudam demais na diversidade de produtos encontrados na Serra da Mantiqueira, especialmente os dinamarqueses. “Os queijos franceses, dinamarqueses italianos feitos lá são de altíssima qualidade. E mesmo sendo estilos europeus, por serem produzidos em Minas, tem nosso terroir, com nosso gado, nosso pasto, nosso clima, nossa cultura. Precisamos nos conectar mais com essa região do Estado, que é mais influenciada por São Paulo, mas é um pedaço especial de Minas Gerais”, complementa.

O chef Eduardo Avelar, convidado para participar da excursão, ficou positivamente surpreendido com tudo o que viu e conheceu. “Apesar de já ter viajado antes por vários anos, cada vez que fazemos uma nova viagem por Minas Gerais, nos surpreendemos. Foram várias ótimas suspresas como descobrir como está avançado o estágio das produções, do desenvolvimento das pessoas, do senso de coletividade e da visão empreeendedora. As pessoas e as comunidades estão se ajudando e trabalhando juntas para melhorar sua autoestima e também o desenvolvimento social e econômico da região. Foi uma experiência muito rica”.

Marcelo Haddad é o idealizador do projeto. Ele acredita que essa ação entrou no planejamento como um ponto de partida para os chefs e empresários donos de restaurantes e a produção do evento terem uma oportunidade para se inspirarem para a criação de pratos que vão participar do circuito. “Essa expedição também diferencia o evento num outro patamar. Estamos fazendo 10 anos do Circuito Gastronômico da Pampulha e precisamos de diferenciais para nos consolidarmos cada vez mais no mercado. É uma oportunidade desses profissionais também conhecerem Minas Gerais e seus sabores. Ano passado, fomos pro Norte do estado e essa é a vez do extremo sul, explorando esse pedaço de Minas. Muitos produtos feitos por lá não são acessados pelos belo-horizontinos, pois a comercialização deles é feita para São Paulo. Foi necessário ir lá, in loco, para enfim acessarmos essas maravilhas da gastronomia do nosso estado. Temos que fortalecer esse elo do interior com sua capital”.

Flávio Trombino, do restaurante Xapuri, é um dos mentores do projeto. Além de participar do evento, ele é um dos entusiastas da expedição. “Apesar de ter sido curta, a expedição foi muito intensa e conseguiu abranger os principais íconesda cultura da Mantiqueira: azeite, café, queijos finos, queijos artesanais e trutas. Todos produtos específicos da região por conta de relevo, clima e geologia. É muito importante valorizarmos a regionalização na nossa cultura, pois conseguimos perder o tal complexo de vira-lata e estamos agora finalmente valorizando o que é nosso. Voltamos para casa como profissionais mais completos e pessoas melhores e, com um dever bem gostoso, pelo excesso de boas opções”, comenta.

Para fechar, Felipe Risola, um dos organizadores do Circuito Gastronômico da Pampulha acredita que esta viagem foi – sem sombra de dúvidas – uma experiência única para os participantes e que com isso o evento ganha uma conotação mais conceitual em busca do desenvolvimento da gastronomia mineira e suas riquezas. “Graças a essa viagem tivemos a oportunidade de vivenciar de perto as riquezas do estado. Em relação aos produtos, produtores e pessoas que fazem acontecer. Após uma imersão dessas, conseguimos vislumbrar e compreender melhor todo o processo envolvido para levar ingredientes como a truta e o queijo à mesa. Foi uma expedição muito feliz e espero que os chefs consigam expressar toda essa cultura nos pratos que serão criados em setembro”, analisa.

Segundo Risola, o momento agora é de estudo e trabalho para absorção de todas as informações coletadas e experiências vividas para a criação das iguarias que serão servidas na edição 2019 do Circuito Gastronômico da Pampulha.


Cédito das fotos: Nereu Jr.

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