Há quase cinco meses, a cultura argentina entrou em uma paralisia total. A situação atual do cinema argentino é crítica. A cultura está em estado de alerta, mobilizando-se em defesa do cinema, e a resposta governamental tem sido a repressão. A solidariedade internacional para que o cinema argentino não morra é fundamental.
Desde sua criação, o INCAA (Instituto Nacional de Cinema e Artes Audiovisuais da Argentina) tem apoiado a produção e realização de filmes e séries de ficção e documentários nacionais multi premiados em todo o mundo. Mas, principalmente, essas obras têm servido para a construção de identidade, memória, visão crítica, imaginários transformadores, mundos possíveis e soberania de todos os argentinos e argentinas.
Estamos vendo a estrutura do nosso Instituto Nacional de Cinema sendo destruída, com o fechamento de programas chave para o acesso universal à cultura e programas que tinham como objetivo visibilizar a participação de mulheres e diversidades no cinema nacional, como o programa Gafas Violetas, que possibilitou que muitos dos nossos filmes continuassem sendo exibidos em ciclos de cinema ao redor do mundo. A quantidade de demissões de trabalhadoras e trabalhadores do Instituto está atingindo 40%
de seu total. Sem trabalhadores não há políticas públicas possíveis.
A pessoa que atualmente preside o INCAA, Carlos Pirovano, decidiu suspender a apresentação de novos projetos de filmes e devolver aqueles que já haviam recebido parecer positivo dos comitês de avaliação de projetos. Também não há medidas de financiamento vigentes para os filmes que iniciavam filmagens este ano. Isso significa que o presidente do Instituto de Cinema decidiu que não se façam filmes. Além disso, suspendeu o apoio a mostras e festivais nacionais, bem como o apoio à distribuição. Ele também não quer que nossos filmes sejam projetados em nosso país. É difícil entender como alguns pensam que é possível melhorar uma situação econômica através da destruição de uma indústria.
Como cineastas participantes desta Mostra de Cinema Argentino de MUJERES, que traz à reflexão nosso papel como mulheres e dissidências na sociedade, e que pode evidenciar os conflitos que atravessam as feminilidades em um mundo patriarcal, queremos somar nossas vozes em defesa da cultura, porque sem ela nos empobrecemos todos, todas, todes. Sem filmes que contem sobre a dor ou sobre o poder que temos como coletivos, o avanço das ultradireitistas no mundo tem rédea solta.
A crise avança permitindo que a concentração, contra a qual tanto lutamos para erradicar, se agrave. Aqui presentes, queremos dizer que o cinema não é um só e que são muitas as vozes e olhares que devem ter seu espaço de expressão. Por isso, pelo nosso direito de ser, dizer, fazer, trabalhar, pensar e
amar, nos abraçamos a este e a cada espaço que resista frente à censura, ao ódio e à fome que querem para nossos povos.
Embora seja triste ter que compartilhar estas palavras neste espaço de celebração – que, como diretoras argentinas, valorizamos e agradecemos – também é uma oportunidade para comunicar nossa realidade atual e compartilhar, através desses importantíssimos pontes culturais de cooperação, que nossa responsabilidade como artistas é continuar encontrando maneiras de nos narrar, mesmo diante da adversidade; continuar construindo nossa identidade individual e coletiva através do que mais amamos fazer: Cinema. Nós, mulheres, sempre fizemos isso. Como trabalhadoras do campo audiovisual, o caminho dos próximos anos se mostra árduo e íngreme. Sendo mulheres, sabemos que será ainda mais
difícil.
Obrigado por promover o cinema argentino de mulheres com tanto cuidado e respeito.
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